27 | Viajando com um cĂŁozinho đ¶
O que aprendi ao fazer uma road trip pela primeira vez com Bitoque. ReflexÔes sobre a tragédia com Joca, como o turismo pode ser pet-friendly e destinos que se destacam.
OlĂĄ! Em vez de começar com uma citação bonita como de costume, peço desculpas pelo meu erro que desencadeou no envio de duas ediçÔes de Portal do Mundo nos Ășltimos dias. Respeito a sua caixa de entrada, aprendi e nĂŁo acontecerĂĄ novamente. Obrigada.
Adotei um cĂŁo hĂĄ dois meses. No Ășltimo fim de semana, tranquei o cinto de segurança no peitoral dele e fomos viajar juntos. Achava que poderia ser cedo demais, e talvez tenha sido, mas a viagem de carro estreitou ainda mais o nosso vĂnculo, principalmente a partir de uma convivĂȘncia intensa.
Antes de mais nada, sinto que devo apresentar o cachorrinho. Bitoque é macho, tem quatro anos, pesa quase oito quilos e não possui raça definida. Sofreu maus-tratos até ser resgatado por um abrigo, de onde tentaram roubå-lo de tão dócil, delicado e calmo que é, especialmente com humanos.
Por muito tempo, adiei a decisĂŁo de adotar um animal. Justificava dizendo que viajava muito. Mas foi bater o olho em uma foto dele para saber que precisava conhecer aquele focinho pintadinho. Sabia que, juntos, darĂamos um jeito.
E estamos dando atĂ© entĂŁo, sobretudo na tentativa de fundir as nossas rotinas. JĂĄ havia apresentado parque, praia e restaurante para ele, trĂȘs dos meus entretenimentos preferidos. Faltava a viagem, algo que decidimos com o aval da mĂ©dica veterinĂĄria. Confesso que me peguei emocionada no dia anterior Ă partida enquanto fazia a âmalaâ canina: documentos, capa de chuva, toalha, caminha, manta, ursinho de roer, ração, petiscos e potinhos.
Como destino, escolhi a Galicia, uma regiĂŁo espanhola que visito anualmente. AlĂ©m da familiaridade, contou a favor a proximidade. No dia em que saĂmos, acordamos no horĂĄrio habitual para o passeio da manhĂŁ, garantindo mais do que nunca que fosse longo. A ideia era fazer com que Bitoque gastasse bastante energia para que pudesse descansar no carro, um ambiente que ainda lhe causava uma leve ansiedade. Deu certo.
O ferormĂŽnio sintĂ©tico jĂĄ vinha ajudando a tranquilizĂĄ-lo sem dopĂĄ-lo, mas a virada de chave foi mesmo a partir do entra e sai do banco de trĂĄs durante as paradas â que tiveram de ser mais frequentes, naturalizaram o passeio para ele e ainda nos brindaram com um ritmo mais lento de viajar, algo sempre bem-vindo. NĂŁo canso de me admirar nĂŁo sĂł com a inteligĂȘncia, mas tambĂ©m com a capacidade de adaptação. Deles e nossa.
Outro momento de aprendizado para o Bitoque foi com o subir e descer as escadas no hotel, que eram vazadas e causaram medo. No começo, tivemos de carregĂĄ-lo no colo, mas nĂŁo demorou muito para ele locomover-se sozinho, devagar, mas de rabinho abanando. LĂĄ, mantivemos a rotina de passeio matinal no mesmo horĂĄrio â com o acrĂ©scimo de ver ovelhas, vacas e cabras, jĂĄ que estĂĄvamos em uma casa de montanha â, o que penso ter contribuĂdo para que nenhum incidente tenha acontecido. O tapete higiĂȘnico sequer foi utilizado.
Na vez em que saĂmos do hotel, reparamos que adorou passear pela praia, pela pequena vila e, principalmente, pelos mirantes para os penhascos da costa galega. Em um deles, nos deu um susto com um pulo cuja altura ainda desconhecĂamos ser capaz. Notamos que foi fundamental ficar com o bichinho junto Ă guia o tempo todo, algo que jĂĄ fazemos no dia a dia, mas que Ă© mais importante em viagem.
O passeio noturno não precisou ser feito, porque Bitoque chegava cansado. Queria mais era aninhar-se conosco na cama. Foi a primeira vez que adormecemos juntos. De enternecer o coração, mas como alguém que se mexe muito à noite fiquei morrendo de medo de machucå-lo e, em dado momento, o colocamos de volta em sua cama ao lado da nossa.
Embora o hotel desse livre acesso aos animais em toda a sua årea, tivemos dificuldade no entorno. Em Cariño, nenhum restaurante tratou-o com cariño era pet-friendly. Foi preciso, então, improvisar: compramos comida no supermercado e comemos em parques e no próprio alojamento.
Muito diferente foi a nossa Ășltima parada antes de voltar para casa. Reservei um restaurante que hĂĄ tempos queria conhecer e sabia que aceitavam mascotas, como os animais de estimação sĂŁo chamados na Espanha. Me empolguei, pedi um menu completo que nos tomou quase trĂȘs horas e testei a paciĂȘncia do Bitoque â algo que nĂŁo voltarei a fazer, especialmente ao final da viagem, quando o cansaço acumula-se entre todos. Para compensar, a equipe do Loxe Mareiro foi extremamente gentil ofertando ĂĄgua, manta, miminhos e tudo mais que pudesse deixĂĄ-lo confortĂĄvel â e a nĂłs tambĂ©m.
Em uma das vĂĄrias etapas da refeição, pediram que nos sentĂĄssemos ao lado da cozinha para observar como alguns pratos eram finalizados. Fiz questĂŁo de confirmar se o cĂŁo poderia ir junto ao que a atendente me respondeu mais do que afirmativamente, fazendo questĂŁo de me lembrar que ali entendiam Bitoque como parte da famĂlia. Aqui tambĂ©m, Alba.
Animal nĂŁo Ă© carga, objeto ou bagagem. Entendo isso mais do que nunca. Evitei ler muitas notĂcias sobre o caso Joca â o golden retriever que deveria ter viajado de SĂŁo Paulo para o Mato Grosso, mas que foi parar em Fortaleza por um erro da Gol e acabou sendo entregue morto ao seu tutor â, mas penso ser importante relembrĂĄ-lo. NĂŁo resistiu ao calor de quase 40 graus, falta de ĂĄgua e comida. Joca tinha a mesma idade de Bitoque.
JĂĄ passou da hora de haver diretrizes mais claras e abrangentes sobre viajar com animais na cabine, independentemente do tamanho. O debate Ă© polĂȘmico, os bichos sĂŁo frequentemente comparado Ă s crianças (pĂ©ssimo) e esta thread dĂĄ o tom. Mas, no porĂŁo, nunca mais. Hoje, quem se lança numa empreitada assim, fica refĂ©m de regras bastante excludentes que mudam de uma empresa para outra. NĂŁo Ă toa começam a surgir companhias aĂ©reas pet-friendly atentas Ă demanda de um dos mercados que mais cresce no mundo, mas ainda sĂŁo poucas e operam linhas limitadas.
O CEO de uma delas, a Bark Air, entrou em uma caixa de transporte de animais, voou por trĂȘs horas e meia longe de outros passageiros e gravou a viagem. Neste vĂdeo impressionante, ele mostra como Ă© a viagem e, ao final, pergunta-se como alguĂ©m pode fazer isso com o prĂłprio cĂŁo. NĂŁo tenho planos de viajar de aviĂŁo com o meu, mas Ă© algo que me causa ansiedade sĂł de pensar na necessidade.
Pela minha brevĂssima experiĂȘncia atĂ© aqui, ficou bastante claro que o Bitoque estĂĄ bem, se estiver conosco. Junto. Temi que estaria exausto nos dias seguintes ao retorno, mas a verdade Ă© que ficou parecendo que quer mais. Fez atĂ© trilha no feriado de quarta-feira. Sempre prontos para a prĂłxima aventura.
UMA ĂLTIMA VISTA D'OLHOS đ
[Inspiração para espreitar antes de ir embora]
â Petletters, a newsletter da mĂ©dica veterinĂĄria apaixonada por escrever sobre histĂłrias de amor entre tutores e seus pets,
;â Uma companhia aĂ©rea pet-friendly, talvez a primeira, que permite os animais irem soltos na cabine;
â Petsitting, uma forma de viajar o mundo de graça;
â Tudo Sobre Cachorros, a escola onde estou matriculada para aprender a cuidar cada vez melhor do meu parceirinho â mĂŁe de pet, sim!;
â As 10 cidades mais amigĂĄveis aos animais na Europa, segundo um levantamento que leva em conta fatores fundamentais aos animais.
Obrigada por ter lido até o fim! As curadorias de lugares onde jå fui e ainda quero ir voltam nas próximas cartinhas, ok?
VocĂȘ toma conta de algum bichinho de estimação? Vou adorar saber mais e, principalmente, se viajam juntos e quais sĂŁo as suas dicas. E tambĂ©m o que acontece quando vocĂȘ viaja e ele fica, algo que ainda vou experimentar.
Bom proveito e atĂ© a prĂłxima edição â toda sexta-feira na tua caixa de entrada ou no aplicativo do Substack!
Um lambeijo,Â
âIn life, it is not where you go, it is who you travel withâ, Charles Schultz, cartunista estadunidense.
Seu Bitoque Ă© o meu Waffles todinho, resgatado dentro de um terreno onde se escondeu depois de muita coisa passar na rua - detalhe que se tratava de um shitsu, talvez tenha fugido de casa e nunca mais foi encontrado. Ele Ă© mais que manso e pacato, Ă© passivo, e provavelmente se tornou assim por causa dos traumas.
Chegou em 2020 e até hoje não suporta o barulho de trovoada, também fomos parar na escolinha para ajuda-lo com esses medos e outras questÔes.
SĂł suportou dormir na mesma cama que nĂłs nos piores dias do inverno, e atĂ© hoje nĂŁo curte nem um pouco contato fĂsico, embora tolere, de tĂŁo bonzinho que Ă©.
Fui lendo a sua news com os olhos molhados, pensar em tudo o que ele jå viveu e ainda assim nos dar um voto de confiança me deixa constrangida de tamanha bondade.
Por aqui as viagens de carro sĂŁo sempre tranquilas, ele adora. Eu ainda sonho em embarcar com ele num aviĂŁo, por que sem dĂșvida qualquer viagem na companhia dele seria melhor do que sem ele, mesmo que eu precise de outras hospedagens, limitar alguns passeios, nĂŁo importa.
Programar os destinos e atividades pensando no conforto deles tambĂ©m se mostrou uma decisĂŁo muito adequada para nĂłs, que caminhamos mais ao ar livre, ficamos em lugares com mais estrutura de casa, evitamos lugares lotados. Ă uma delĂcia!
Eu sou tutor de uma doguinha de 10 anos, jĂĄ com sua dose de problemas de saĂșde. Quando nova e eu era casado, ela viajou conosco duas ou trĂȘs vezes, mas sempre pras casas dos meus entĂŁo sogros. Era de aviĂŁo, mas deu pra ela ir na cabine, meio no limite. Mas sempre foi bem desconfortĂĄvel para ela. E ambos Ă©ramos inexperientes como tutores de pets tambĂ©m. Hoje eu teria feito muita coisa diferente. Depois passamos a deixĂĄ-la com minha mĂŁe durante as viagens e hoje que sou divorciado fica com minha ex quando eu viajo e comigo quando Ă© ela, entĂŁo Ă© tranquilo (a guarda Ă© compartilhada). Mas pela falta de costume, ela fica mais satisfeita em casa. JĂĄ foi difĂcil de se adaptar em duas casas.
Mas acho sensacional, hoje tĂĄ crescendo bastante aqui nos lugares onde costumo ir, como a Chapada dos Veadeiros, a oferta de lugares pet friendly.